Um complexo arquitetônico formado por seis edifícios construídos numa área de 138 mil metros quadrados, onde circulam diariamente cerca de sete mil pessoas. A grande estrutura conhecida como Tribunal da Cidadania julgou no ano passado mais processos do que os recebidos no exercício de 2014, reduzindo o estoque em 8% (fato que não ocorria desde 2011). Foram distribuídos 332.905 processos, julgados 358.813 e baixados outros 341.536 durante 2015.
Essa corte, que tem a missão constitucional de interpretar a legislação federal e uniformizá-la, com vista à pacificação social, tem em sua engrenagem uma força de trabalho feminina que representa mais de 50%, entre os servidores e servidoras. Entre os ministros, quase 20% são mulheres.
Os números na Casa apenas refletem o avanço feminino no acesso ao mercado de trabalho, no Brasil, em especial a partir da segunda metade do século XX. Em 1950, somente 13,6% das mulheres em idade ativa participavam do mercado de trabalho. Em 2009, o percentual aumentou para 52,7%.
Dos trabalhos mais simples, até os mais complexos e estratégicos, as mulheres revelam o seu envolvimento e comprometimento com o trabalho apesar das dificuldades enfrentadas na sociedade como expressa a vice-presidente, ministra Laurita Vaz.
“Ainda se espera da mulher a mesma dedicação as tarefas domésticas de outrora. Elas têm que se desdobrar para cumprir dupla jornada: uma no exigente mercado de trabalho, onde sempre precisam renovar a prova de sua capacidade, e outra da casa. Assim, a mulher sempre acaba por acumular muito mais atribuições que os homens”.
É uma dificuldade enfrentada pela também ministra Assusete Magalhães. Ela declara que, para conciliar vida funcional e pessoal, é necessário ter “muita dedicação, trabalho, organização, disciplina e uma proveitosa parceria entre mulheres e homens, envolvendo filhos e marido, no âmbito familiar, bem como o auxílio valioso de colaboradoras domésticas”.
Da recepção aos processos
Quando você chega à portaria da Taquigrafia, a partir das 9h, você é recepcionado pela colega Lena Rodrigues, vigilante feminino que trabalha aqui há 23 anos. Segundo ela, seu papel é “prestar segurança aos funcionários e ministros”. As dificuldades jornada ela compensa com amor ao trabalho. “Foi com esse trabalho que consegui criar meus filhos. O STJ é um lugar muito aconchegante”.
As dúvidas de encaminhamento são sanadas com a Lena, que muitas vezes, direciona usuários para a área-fim do tribunal como, por exemplo, à Secretária dos Órgãos Julgadores, chefiada pela colega Cláudia Austregésilo de Athayde Beck. A servidora coordenou a Quarta Turma por 22 anos e está à frente da SOJ desde 2008, quando o processo eletrônico transformou a realidade do STJ.
Cláudia destaca que se sente realizada profissionalmente no Tribunal da Cidadania, uma casa que valoriza o papel das mulheres, permitindo-lhes ocupar qualquer cargo para o qual demonstrem estar aptas. “São secretárias, assessoras, coordenadoras e chefes de seção que compartilham em pé de igualdade com os homens as tarefas do cotidiano da corte”.
Na Vice-Presidência
Não são poucas as atribuições na rotina da colega Rita Candeia, chefe de gabinete na Vice-Presidência. A unidade compõe a Corte Especial, atua na substituição ao presidente em ausências oficiais, julga processos de competência desse colegiado e decide sobre a admissibilidade de recursos para o Supremo Tribunal Federal, entre outras atividades.
Rita é responsável pela gestão de pessoal e patrimonial do Gabinete, além de organizar a rotina da ministra. Rita se sente valorizada em suas inúmeras tarefas. “O STJ preocupa-se com as peculiaridades da mulher, como, por exemplo, o acompanhamento à saúde feminina prestada pela Secretaria de Serviços Integrados de Saúde (SIS). É um tribunal pioneiro nessas práticas”.
Esse reconhecimento expressado pela colega, também é constatado pela estagiária de letras, Larissa Rocha. "A experiência foi válida! Aqui no STJ temos bons exemplos de ministras batalhadoras, inteligentes, que buscam sempre fazer a justiça", declara.
Julgar e proferir decisões
Esse é o universo, que hoje, no STJ, também é composto por seis ministras. Uma história que começou em 1999, com a entrada da ministra Eliana Calmon, atualmente aposentada. Emocionada, ela recorda o dia de sua posse: “Eu não esperava, mas a imprensa deu uma divulgação muito grande e as mulheres, nos movimentos feministas, ficaram orgulhosas. A minha posse foi um acontecimento. Eu não fui aplaudida, eu fui ovacionada”.
Ao longo desses sete anos, é inegável a influência feminina nos julgamentos como avalia a ministra Regina Helena. “Eu penso que no STJ as mulheres são julgadoras muito cautelosas, muito detalhistas. Normalmente, nas discussões tem participação feminina. Pelo menos de uma ministra, como é o caso da Primeira Turma, que eu integro”.
Ela convida as mulheres que gostam do direito a fazer parte do time: “A magistratura precisa de valores, e valores femininos também. Venham colaborar conosco e tornar a sociedade brasileira melhor!
Quem é quem no tribunal
Lidar diretamente com os servidores, ouvir as expectativas deles e buscar harmonizá-las com os interesses institucionais. Essa é a tarefa nada fácil da secretária de Gestão de Pessoas, Solange Rossi, há mais de 26 anos no Tribunal.
Com a experiência que os anos trazem e apaixonada pelo que faz, a colega avalia o desempenho das mulheres como positivo. “Em geral, são perspicazes e meticulosas. Apesar da sobrecarga de funções, sinto que há muita energia e entrega no desempenho das tarefas funcionais. Hoje, as mulheres desfrutam de influência e poder, raramente encontradas em tempos remotos”, conclui.
Trabalhando diretamente com Solange, a também colega Lúcia revela o Tribunal sempre buscou a garantia dos direitos de seus servidores. A servidora destacou , ainda, as boas condições e a valorização de seu trabalho, além do bom relacionamento com os colegas.
A luta continua
Apesar das conquistas a vice-presidente do STJ chama a atenção para o fato de que quando se trata das instâncias superiores e de cargos providos por indicação, o que se tem é uma diminuta participação das mulheres, lembra a ministra Laurita Vaz.
A ministra Assusete defende que a condição de igualdade de gênero só se verá implementada, de fato, com efetiva modificação cultural de nossa sociedade. Isso inclui: políticas públicas que fomentem a criação de creches e de infraestrutura para a mulher trabalhadora; melhor distribuição das tarefas domésticas e dos cuidados com os filhos e idosos; paridade salarial entre homens e mulheres; possibilidade igualitária de acesso ao mercado de trabalho, entre outras iniciativas.
Nesse sentido, elogia a iniciativa do Tribunal ao criar um berçário para suas servidoras, “permitindo-lhes tranquilidade no exercício da atividade funcional, sem prejuízo da assistência aos filhos”. Segundo ela, uma iniciativa digna de aplausos, que merece ser reproduzida, nas esferas pública e privada.
Reportagem: Karla Bezerra
Edição: Vannildo Mendes
Fotos: Emerson Leal, José Alberto, Saulo Cruz e Ségio Amaral
Revisão de português: Larissa Rocha
Produção: Jaime Santana e Juliana Bender