REsp 1.648.238-RS, Rel. Min. Gurgel de Faria, Corte Especial, por unanimidade, julgado em 20/06/2018, DJe 27/06/2018 (Tema 973)
DIREITO PROCESSUAL CIVIL
Cumprimento de sentença. Ação coletiva contra a Fazenda Pública. Ausência de Impugnação. Honorários advocatícios. Cabimento. CPC/2015. Mudança no ordenamento jurídico. Entendimento consolidado. Súmula n. 345/STJ. Incidência. Tema 973.
O art. 85, § 7º, do CPC/2015 não afasta a aplicação do entendimento consolidado na Súmula 345 do STJ, de modo que são devidos honorários advocatícios nos procedimentos individuais de cumprimento de sentença decorrente de ação coletiva, ainda que não impugnados e promovidos em litisconsórcio.
A Corte Especial, quando do julgamento do EREsp 653.270/RS, Rel. Min. José Delgado, sessão de 17/05/2006 (DJ 05/02/2007), decidiu que, "nas execuções individuais procedentes de sentença genérica proferida em ação coletiva ou ação civil pública, é cabível a condenação da Fazenda Pública ao pagamento de honorários advocatícios, ainda que não embargada a execução". Diante de outros arestos que vieram a confirmar essa assertiva, a Corte Especial consolidou o seu entendimento mediante a edição da Súmula 345, que restringe a aplicação do art. 1º-D da Lei n. 9.494/1997, que dispõe que "não serão devidos honorários advocatícios pela Fazenda Pública nas execuções não embargadas", às execuções de título judicial, resistida ou não, procedentes de título judicial proferido em ação coletiva ajuizada por sindicato ou entidade de classe, como substitutivo processual, ou em sede de ação civil pública, ambas promovidas contra a Fazenda Pública. O tema agora se renova em face da edição do novel diploma processual civil. No entanto, não existe razão para se afastar a solução outrora consagrada pelo Superior Tribunal de Justiça, no sentido da aplicação e vigência da Súmula 345 do STJ. Assim, a interpretação que deve ser dada ao art. 85, § 7º, do CPC/2015, que dispõe que "não serão devidos honorários no cumprimento de sentença contra a Fazenda Pública que enseje expedição de precatório, desde que não tenha sido impugnada", é a de que, caso a relação jurídica existente entre as partes esteja concluída desde a ação ordinária, não caberá a condenação em honorários advocatícios se não houver a apresentação de impugnação. Isso porque o cumprimento de sentença de que trata o referido diploma legal é decorrência lógica do mesmo processo cognitivo. Entretanto, nas decisões coletivas - lato sensu - não se especifica o quantum devido nem a identidade dos titulares do direito subjetivo, sendo elas mais limitadas do que as que decorrem das demais sentenças condenatórias típicas. Assim, transfere-se para a fase de cumprimento a obrigação cognitiva relacionada com o direito individual de receber o que findou reconhecido na ação ordinária. Em face disso, a execução desse título judicial pressupõe cognição exauriente, cuja resolução se deve dar com estrita observância dos postulados da ampla defesa e do contraditório, a despeito do nome dado ao procedimento, que induz a indevida compreensão de se estar diante de mera fase de cumprimento, de cognição limitada. Diante desse quadro, não houve mudança no ordenamento jurídico, uma vez que o citado art. 85, § 7º, do CPC/2015 reproduz basicamente o contido no art. 1º-D da Lei n. 9.494/1997, em relação ao qual o entendimento desta Corte, já consagrado, é no sentido de afastar a aplicação do aludido comando nas execuções individuais, ainda que promovidas por litisconsorte, do julgado proferido em sede de ação coletiva lato sensu, ação civil pública ou ação de classe.
REsp 1.552.434-GO, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Segunda Seção, por unanimidade, julgado em 13/06/2018, DJe 21/06/2018 (Tema 968)
DIREITO CIVIL, DIREITO BANCÁRIO
Negócios jurídicos bancários. Mútuo feneratício. Repetição de indébito. Juros remuneratórios. Restituição pela mesma taxa pactuada no contrato. Descabimento. Tema 968/STJ.
Tese aplicável a todo contrato de mútuo feneratício celebrado com instituição financeira mutuante: "Descabimento da repetição do indébito com os mesmos encargos do contrato".
Inicialmente, considerando a preocupação acerca do enriquecimento ilícito da instituição financeira, a doutrina vem estudando o problema da repetição de indébito decorrente de mútuo feneratício celebrado com instituição financeira sob a ótica do tema do "lucro da intervenção", que é o "lucro obtido por aquele que, sem autorização, interfere nos direitos ou bens jurídicos de outra pessoa e que decorre justamente desta intervenção". Esse lucro também pode ser vislumbrado na hipótese da presente afetação, pois, como os bancos praticam taxas de juros bem mais altas do que a taxa legal, a instituição financeira acaba auferindo vantagem dessa diferença de taxas, mesmo restituindo o indébito à taxa legal. Nesse sentido, a instituição financeira teria que ser condenada não somente a reparar o dano causado ao mutuário, mas também a restituir o lucro que obteve com a cláusula abusiva. Por um lado, o lucro da intervenção é um plus em relação à indenização, no sentido de que esta encontra limite na extensão dos danos experimentados pela vítima (função indenitária do princípio da reparação integral), ao passo que o lucro da intervenção pode extrapolar esse limite. Por outro lado, o referido lucro é um minus em relação ao punitive damage, uma vez que este, tendo simultaneamente funções punitiva e preventiva, não está limitado ao lucro ou ao dano. Propõe-se, no presente repetitivo, uma tese menos abrangente, apenas para eliminar a possibilidade de se determinar a repetição com base nos mesmos encargos praticados pela instituição financeira, pois esses encargos não correspondem ao dano experimentado pela vítima, tampouco ao lucro auferido pelo ofensor.
EREsp 1.623.858-MG, Rel. Min. Lázaro Guimarães (Desembargador Convocado do TRF 5ª Região), por unanimidade, julgado em 23/05/2018, DJe 30/05/2018
DIREITO CIVIL
Casamento contraído sob causa suspensiva. Separação obrigatória de bens (CC/1916, art. 258, II; CC/2002, art. 1.641, II). Partilha. Bens adquiridos onerosamente. Necessidade de prova do esforço comum. Pressuposto da pretensão. Moderna compreensão da Súmula 377/STF.
No regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento, desde que comprovado o esforço comum para sua aquisição.
A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça uniformizou o entendimento que encontrava dissonância no âmbito da Terceira e da Quarta Turma. De início, cumpre informar que a Súmula 377/STF dispõe que "no regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento". Esse enunciado pode ser interpretado de duas formas: 1) no regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento, sendo presumido o esforço comum na aquisição do acervo; e 2) no regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento, desde que comprovado o esforço comum para sua aquisição. No entanto, a adoção da compreensão de que o esforço comum deve ser presumido (por ser a regra) conduz à ineficácia do regime da separação obrigatória (ou legal) de bens, pois, para afastar a presunção, deverá o interessado fazer prova negativa, comprovar que o ex-cônjuge ou ex-companheiro em nada contribuiu para a aquisição onerosa de determinado bem, conquanto tenha sido a coisa adquirida na constância da união. Torna, portanto, praticamente impossível a separação dos aquestos. Por sua vez, o entendimento de que a comunhão dos bens adquiridos pode ocorrer, desde que comprovado o esforço comum, parece mais consentânea com o sistema legal de regime de bens do casamento, recentemente adotado no Código Civil de 2002, pois prestigia a eficácia do regime de separação legal de bens. Caberá ao interessado comprovar que teve efetiva e relevante (ainda que não financeira) participação no esforço para aquisição onerosa de determinado bem a ser partilhado com a dissolução da união (prova positiva).
REsp 1.662.551-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, por maioria, julgado em 15/05/2018, DJe 25/06/2018
DIREITO CIVIL
Responsabilidade civil da transportadora. Ato libidinoso praticado contra passageira no inteior de trem. Dano moral configurado. Fortuito interno. Conexidade com a atividade de transporte de pessoas.
A concessionária de transporte ferroviário pode responder por dano moral sofrido por passageira, vítima de assédio sexual, praticado por outro usuário no interior do trem.
De início, registre-se que o Supremo Tribunal Federal, em julgamento de recurso extraordinário representativo da controvérsia, determinou que a pessoa jurídica de direito privado, prestadora de serviço público, ostenta responsabilidade objetiva em relação a terceiros usuários ou não usuários do serviço público, nos termos do artigo 37, § 6º, da Constituição da República de 1988 (RE 591.874/MS, publicado no DJe de 21/11/2008). Em reforço à responsabilidade objetiva do transportador, não se pode olvidar que a legislação consumerista receitua que o fornecedor de serviços responde pela reparação dos danos causados, independentemente da existência de culpa, decorrente dos defeitos relativos à prestação destes serviços, nos termos do art. 14, §§ 1º e 3º, do CDC. Ademais, a cláusula de incolumidade é ínsita ao contrato de transporte, implicando obrigação de resultado do transportador, consistente em levar o passageiro com conforto e segurança ao seu destino, salvo se demonstrada causa de exclusão do nexo de causalidade, notadamente o caso fortuito, a força maior ou a culpa exclusiva da vítima ou de terceiro. O fato de terceiro, conforme se apresente, pode ou não romper o nexo de causalidade. Exclui-se a responsabilidade do transportador quando a conduta praticada por terceiro, sendo causa única do evento danoso, não guarda relação com a organização do negócio e os riscos da atividade de transporte, equiparando-se a fortuito externo. De outro turno, a culpa de terceiro não é apta a romper o nexo causal quando se mostra conexa à atividade econômica e aos riscos inerentes à sua exploração, caracterizando fortuito interno. Por envolver, necessariamente, uma grande aglomeração de pessoas em um mesmo espaço físico, aliados à baixa qualidade do serviço prestado, incluído a pouca quantidade de vagões ou ônibus postos à disposição do público, a prestação do serviço de transporte de passageiros vem propiciando a ocorrência de eventos de assédio sexual. Em outros termos, mais que um simples cenário ou ocasião, o transporte público tem concorrido para a causa dos eventos de assédio sexual. Em tal contexto, a ocorrência desses fatos acaba sendo arrastada para o bojo da prestação do serviço de transporte público, tornando-se assim mais um risco da atividade, a qual todos os passageiros, mas especialmente as mulheres, tornam-se vítimas. Conclui-se que, se a ocorrência do assédio sexual guardar conexidade com os serviços prestados pela concessionária e, tratando-se de fortuito interno, a transportadora de passageiros permanece objetivamente responsável pelos danos causados.
REsp 1.361.354-RS, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, por unanimidade, julgado em 22/05/2018, DJe 25/06/2018
DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL
Seguro de vida. Indenização. Natureza alimentar. Impenhorabilidade. 40 (quarenta) salários mínimos. Limitação. Aplicação analógica do art. 649, X, do CPC/1973.
A impenhorabilidade dos valores recebidos pelo beneficiário do seguro de vida limita-se ao montante de 40 (quarenta) salários mínimos.
Discute-se possibilidade de penhora da indenização recebida pelo beneficiário do seguro de vida quando a indenização é incorporada ao seu patrimônio. Cumpre salientar, de início, que há de prevalecer o direito do beneficiário do seguro de vida sobre o direito do credor, de modo a preservar o mínimo necessário à sua sobrevivência. A finalidade do seguro de vida é proporcionar um rendimento a alguém, não o deixando à míngua de recursos. A razão da impenhorabilidade, portanto, está no caráter alimentar do benefício. Registre-se que a natureza alimentar da indenização recebida pelo beneficiário do seguro de vida foi presumida pelo legislador, constituindo-se em projeção futura em prol do sustento e subsistência do beneficiário, razão por que conferiu a impenhorabilidade de tal benefício. A impenhorabilidade estabelecida em favor do beneficiário, portanto, deve corresponder à finalidade do seguro de vida, que é criar um fundo alimentar, prospectivo e resguardado, e não se traduzir em mais um meio para pagamento de dívidas. Nesse sentido, ao invés de imputar ao beneficiário do seguro o ônus de provar sua condição socioeconômica para aferir a natureza alimentar da indenização, deve-se limitar o montante impenhorável em 40 (quarenta) salários mínimos, por aplicação analógica do art. 649, X, do CPC/1973. A quantia que a exceder poderá ser utilizada para saldar os débitos dos credores do beneficiário do seguro. Ressalte-se que a natureza alimentar da indenização recebida com o seguro de vida se assemelha às verbas salariais do art. 649, IV, do CPC/1973, que destaca serem impenhoráveis "as quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e de sua família".
REsp 1.660.168-RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, Rel. Acd. Min. Marco Aurélio Bellizze, por maioria, julgado em 08/05/2018, DJe 05/06/2018
DIREITO CIVIL, DIREITO DO CONSUMIDOR
Ação de obrigação de fazer. Provedor de aplicação de pesquisa na internet. Proteção a dados pessoais. Desvinculação entre nome e resultado de pesquisa. Direito ao esquecimento. Possibilidade.
É possível determinar o rompimento do vínculo estabelecido por provedores de aplicação de busca na internet entre o nome de prejudicado, utilizado como critério exclusivo de busca, e a notícia apontada nos resultados.
No caso, pleiteia-se a desindexação do nome da recorrente, em resultados nas aplicações de busca na internet, de notícia sobre fraude em concurso público, no qual havia sido reprovada. Atualmente, o fato referido já conta com mais de uma década, e ainda hoje os resultados de busca apontam como mais relevantes as notícias a ela relacionadas, como se, ao longo desta década, não houvesse nenhum desdobramento da notícia nem fatos novos relacionados ao nome da autora. Quanto ao assunto, a jurisprudência desta Corte Superior tem entendimento reiterado no sentido de afastar a responsabilidade de buscadores da internet pelos resultados de busca apresentados, reconhecendo a impossibilidade de lhe atribuir a função de censor e impondo ao prejudicado o direcionamento de sua pretensão contra os provedores de conteúdo, responsáveis pela disponibilização do conteúdo indevido na internet. Há, todavia, circunstâncias excepcionalíssimas em que é necessária a intervenção pontual do Poder Judiciário para fazer cessar o vínculo criado, nos bancos de dados dos provedores de busca, entre dados pessoais e resultados da busca, que não guardam relevância para interesse público à informação, seja pelo conteúdo eminentemente privado, seja pelo decurso do tempo. Essa é a essência do direito ao esquecimento: não se trata de efetivamente apagar o passado, mas de permitir que a pessoa envolvida siga sua vida com razoável anonimato, não sendo o fato desabonador corriqueiramente rememorado e perenizado por sistemas automatizados de busca. Por outro vértice, aqueles que quiserem ter acesso a informações relativas a fraudes em concurso público, não terão seu direito de acesso impedido, porquanto as fontes que mencionam inclusive o nome da autora permanecerão acessíveis. Contudo, sua busca deverá conter critérios relativos a esse conteúdo, seja em conjunto com o nome da autora, seja de forma autônoma.
REsp 1.624.050-MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, por unanimidade, julgado em 19/06/2018, DJe 22/06/2018
DIREITO CIVIL, DIREITO PROCESSUAL CIVIL
Ação de alimentos. Diferença de valor ou percentual entre filhos. Possibilidade. Excepcionalidade. Necessidades distintas entre os alimentandos. Capacidades de contribuições diferenciadas dos genitores.
Excepcionalmente, é admissível a fixação de alimentos em valores ou em percentuais diferentes entre os filhos.
Inicialmente, ressalta-se que do princípio da igualdade entre os filhos, previsto no art. 227, § 6º, da Constituição Federal, deduz-se que não deverá haver, em regra, diferença no valor ou no percentual dos alimentos destinados à prole, pois se presume que, em tese, os filhos - indistintamente - possuem as mesmas demandas vitais, tenham as mesmas condições dignas de sobrevivência e igual acesso às necessidades mais elementares da pessoa humana. A igualdade entre os filhos, todavia, não tem natureza absoluta e inflexível, sendo possível vislumbrar situações em que a fixação de alimentos em valor ou percentual distinto entre a prole é admissível, razoável e até mesmo indispensável, seja a questão examinada sob a ótica da necessidade do alimentado, seja o tema visto sob o enfoque da capacidade contributiva dos alimentantes. Exemplificando, um filho portador de uma doença congênita pode receber um valor ou percentual diferenciado em relação ao filho nascido saudável, pois possui uma necessidade específica que objetivamente justifica a distinção, não havendo ofensa ao princípio constitucional da igualdade. A mesma regra se aplica quando se examina a questão sob a perspectiva da capacidade de contribuição do alimentante, sobretudo quando se constata que a regra do art. 1.703 do CC/2002 estipula que é dever de ambos os cônjuges contribuir para a manutenção dos filhos na proporção de seus recursos. Assim, poderá ser justificável a fixação de alimentos diferenciados entre a prole se, por exemplo, sendo os filhos oriundos de distintos relacionamentos, houver melhor capacidade de contribuição de um genitor ou genitora em relação ao outro.
REsp 1.578.848-RS, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, por unanimidade, julgado em 19/06/2018, DJe 25/06/2018
DIREITO PROCESSUAL CIVIL
Embargos de terceiro. Reconvenção. Não cabimento. CPC/1973. Incompatibilidade de ritos.
Não é cabível a reconvenção apresentada em embargos de terceiro, sob a égide do Código de Processo Civil de 1973.
Inicialmente cumpre salientar que o rito dos embargos de terceiro após a fase de contestação não é ordinário, mas especial, ou seja, aquele previsto para as medidas de natureza cautelar. Daí se concluir pelo não cabimento de reconvenção nos embargos de terceiro, pois aquela pressupõe a compatibilidade procedimental. Essa exigência decorre do fato de que as ações (principal e reconvencional) terão processamento conjunto, não se admitindo a prática de atos apenas em uma das demandas, sob pena de causar tumulto processual e retardar a prestação jurisdicional. Quando se fala em embargos de terceiro, esse requisito assume superlativa relevância, pois se trata de demanda de rito célere, que busca assegurar um bem da vida em caráter de urgência. Além disso, os embargos de terceiro geralmente estão vinculados a uma ordem judicial emanada de outra demanda, que também sofreria as consequências do retardamento provocado pela apresentação de reconvenção. Nesse contexto, independentemente do preenchimento do requisito disposto no artigo 315 do Código de Processo Civil de 1973 (conexão do objeto da reconvenção com o da ação principal), exige-se, em qualquer caso, a compatibilidade procedimental nos moldes do que ocorre com a cumulação de pedidos prevista no artigo 292, § 1º, inciso III, do Código de Processo Civil de 1973. Deste modo, é incabível a reconvenção apresentada em embargos de terceiro sob a égide do Código de Processo Civil de 1973.
REsp 1.400.607-RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, por unanimidade, julgado em 17/05/2018, DJe 26/06/2018
DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL
Contrato de mútuo com pacto adjeto de hipoteca. Credor hipotecário. Interesse de agir. Ajuizamento de execução para a observância de padrões construtivos. Possibilidade.
O credor hipotecário tem interesse de agir para propor ação em face do mutuário visando ao cumprimento de cláusula contratual que determina a observância dos padrões construtivos do loteamento.
A hipoteca é direito real de garantia por meio do qual o devedor permanece com o domínio e posse, mas, em caso de inadimplência ou perecimento da coisa, o credor tem a faculdade de promover a venda judicial do bem, recebendo o produto até o valor total do crédito, com preferência. Além disso, a hipoteca tem característica de indivisibilidade e acessoriedade e a coisa dada em garantia, embora não suscetível ao pacto comissório, fica sujeita, por vínculo real, a cumprimento da obrigação principal. Assim, por um lado, à luz da causa de pedir da execução, não bastasse ressair nítido o interesse do credor hipotecário em não ver, ao arrepio do contrato, depreciado o bem que consubstancia a garantia real de seu crédito, o art. 1.474 do CC estabelece que a hipoteca abrange todas as acessões, melhoramentos ou construções do imóvel. Por outro lado, o art. 1.425, I, do CC estabelece que a dívida considera-se vencida se, deteriorando-se, ou depreciando-se o bem dado em segurança, desfalcar a garantia, e o devedor, intimado, não a reforçar ou substituir. Com efeito, em sendo imprevisível se a eventual venda do bem imóvel dado em garantia seria suficiente para o pagamento da dívida do executado, é patente o interesse de agir da exequente, visto que, mesmo com a subsistência do terreno, é mesmo possível a depreciação do bem dado em garantia em vista de ter sido erigido construção incompatível com os padrões estabelecidos para o loteamento.
REsp 1.412.993-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Rel. Acd. Min. Maria Isabel Gallotti, por maioria, julgado em 08/05/2018, DJe 07/06/2018
DIREITO DO CONSUMIDOR
Ação civil pública. Compra e venda realizada pela internet. Atraso na entrega. Demora na restituição do valor pago pelo consumidor arrependido. Imposição por sentença coletiva de cláusula penal. Ausência de previsão legal ou contratual. Inexistência no contrato de multa em prol do fornecedor passível de inversão.
Em compras realizadas na internet, o fato de o consumidor ser penalizado com a obrigação de arcar com multa moratória, prevista no contrato com a financeira, quando atrasa o pagamento de suas faturas de cartão de crédito não autoriza a imposição, por sentença coletiva, de cláusula penal ao fornecedor de bens móveis, nos casos de atraso na entrega da mercadoria e na demora de restituição do valor pago quando do exercício do direito do arrependimento.
O contrato de cartão de crédito não pode ser chamado de acessório ao pacto de compra e venda. Na verdade, se trata de pactos autônomos, com fornecedores de serviços diversos (compra e venda e financeiro) e cláusulas diferentes e incomunicáveis. No pacto entre o consumidor e a operadora de cartão por ele escolhida não se pode cogitar de desequilíbrio contratual, uma vez que a cobrança de encargos moratórios é contrapartida contratual e legalmente prevista diante da mora do consumidor, que obteve o crédito de forma fácil e desembaraçada, sem prestar garantia adicional alguma além da promessa de pagar no prazo acertado. Já no pacto de compra e venda, a empresa fornecedora recebe o preço (da operadora de cartão de crédito), e só depois de confirmado o pagamento, envia o produto ao consumidor. Não há risco de mora do consumidor em relação à fornecedora, e, por isso, logicamente, não há previsão de multa moratória em prol do fornecedor. Por seu turno, não se vislumbra que a imposição, por sentença coletiva, de multa em desfavor da empresa fornecedora seja um corolário do princípio do equilíbrio contratual entre comprador e vendedor erigido no Código de Defesa do Consumidor. O art. 49 do CDC dispõe que o fornecedor, nos casos em que o consumidor exercita o direito de arrependimento, deverá restituir imediatamente o valor pago, com atualização. A previsão da atualização monetária denota que pode haver demora no reembolso ao consumidor - mas essa demora não prejudica o equilíbrio da relação de consumo a ponto de demandar a imposição, genérica e abstrata, por lei, de cláusula penal. Em suma, o legislador não anteviu quebra automática e necessária no equilíbrio contratual nos casos de atraso na entrega de mercadoria ou restituição decorrente de arrependimento, ao menos não a ponto de lançar mão da imposição da multa ao fornecedor, como norma geral e abstrata. Assim, dado que ao Poder Judiciário não é atribuída a tarefa de substituir o legislador, a "inversão" da cláusula deve partir do atendimento a dois pressupostos lógicos: a) que a cláusula penal tenha sido, efetivamente, celebrada no pacto; b) haja quebra do equilíbrio contratual, em afronta ao princípio consagrado no art. 4º, III, do CDC. Nenhum desses requisitos se faz presente no caso sob exame.