Processo em segredo judicial, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, por maioria, julgado em 21/06/2022, DJe 30/06/2022.
DIREITO CIVIL, DIREITO PROCESSUAL CIVIL
Juízo de retratação. Direito ao esquecimento. Tese fixada pelo Supremo Tribunal Federal (Tema 786/STF). Acórdão da Terceira Turma do STJ. Ausência de determinação de exclusão da pesquisa. Determinação da desvinculação do nome da autora, sem qualquer outro termo, com a matéria desabonadora referente à fraude em concurso público. Preservação do conteúdo. Conciliação entre o direito individual à intimidade e à privacidade e o direito coletivo à informação. Juízo de retratação não exercido.
A determinação para que os provedores de busca na internet procedam a desvinculação do nome de determinada pessoa, sem qualquer outro termo empregado, com fato desabonador a seu respeito dos resultados de pesquisa não se confunde com o direito ao esquecimento, objeto da tese de repercussão geral 786/STF.
Trata-se de juízo de retratação, para os fins do art. 1.040, inciso II, do CPC/2015, em decorrência do julgamento do RE 1.010.606/RJ, cuja repercussão geral foi reconhecida e no qual o Supremo Tribunal Federal fixou a seguinte tese (Tema 786): É incompatível com a Constituição a ideia de um direito ao esquecimento, assim entendido como o poder de obstar, em razão da passagem do tempo, a divulgação de fatos ou dados verídicos e licitamente obtidos e publicados em meios de comunicação social analógicos ou digitais. Eventuais excessos ou abusos no exercício da liberdade de expressão e de informação devem ser analisados caso a caso, a partir dos parâmetros constitucionais - especialmente os relativos à proteção da honra, da imagem, da privacidade e da personalidade em geral - e as expressas e específicas previsões legais nos âmbitos penal e cível.
No acórdão proferido pela Terceira Turma do STJ, a autora ajuizou ação de obrigação de fazer, pleiteando a "desindexação", nos resultados das buscas mantidas pelas rés, de notícias relacionadas às suspeitas de fraude em concurso público. A autora alegou que a indexação desses conteúdos seria causa de danos à sua dignidade e privacidade e, assim, defendeu a necessária filtragem dos resultados de buscas que utilizem seu nome como parâmetro, a fim de desvinculá-la das mencionadas reportagens.
Da análise do inteiro teor desse decisum, verifica-se que a insurgência era restrita ao apontamento do nome da autora, como critério exclusivo e desvinculado de qualquer outro termo, e a exibição de fato desabonador divulgado há mais de dez anos entre as notícias mais relevantes, sendo que a manutenção desses resultados acabava por retroalimentar o sistema, uma vez que, ao realizar a busca pelo nome da autora e se deparar com a notícia, o cliente acessaria o conteúdo - até movido por curiosidade despertada em razão da exibição do link - reforçando, no sistema automatizado, a confirmação da relevância da página catalogada.
A Terceira Turma, portanto, não permitiu que a autora impedisse, em razão da passagem do tempo, a divulgação dos fatos relacionados à suposta fraude no concurso público, o que seria, na linha do acórdão proferido no recurso extraordinário supracitado, acolher o direito ao esquecimento.
Na verdade, a questão foi decidida sob o prisma dos direitos fundamentais à intimidade e à privacidade, bem como à proteção de dados pessoais, não sendo determinada a exclusão da pesquisa no banco de dados pertencentes às rés, havendo apenas a determinação da desvinculação do nome da autora, sem qualquer outro termo, com a matéria desabonadora referente à fraude no concurso. O conteúdo, portanto, foi preservado.
Em outras palavras, a Terceira Turma do STJ não determinou que os provedores de busca na internet retirassem o resultado acerca da fraude no concurso do índice de pesquisa, mas apenas determinou a sua desindexação, isto é, a desvinculação do nome da autora, sem qualquer outro termo empregado, com o fato relacionado à suposta fraude no concurso público, ocorrido há mais de uma década.
Esse fundamento, aliás, foi consignado expressamente na própria ementa do acórdão proferido por esta Corte Superior, onde constou que "o rompimento do referido vínculo sem a exclusão da notícia compatibiliza também os interesses individual do titular dos dados pessoais e coletivo de acesso à informação, na medida em que viabiliza a localização das notícias àqueles que direcionem sua pesquisa fornecendo argumentos de pesquisa relacionados ao fato noticiado, mas não àqueles que buscam exclusivamente pelos dados pessoais do indivíduo protegido".
No particular, vale destacar que o próprio Ministro Dias Toffoli, Relator do RE 1.010.606/RJ, que deu origem ao Tema 786/STF, afirmou categoricamente que o caso examinado pelo Supremo não tratava de eventual responsabilidade de provedores de internet em relação à indexação ou desindexação de conteúdos.
Em outras palavras, conforme ressaltado pelo Supremo Tribunal Federal, o direito à desindexação - que foi reconhecido por esta Terceira Turma - não se confunde com o direito ao esquecimento, objeto de análise no recurso extraordinário que deu origem à tese fixada no Tema 786/STF, razão pela qual não há que se falar em descumprimento da referida tese por esta Corte Superior.
REsp 1.660.168-RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, Rel. Acd. Min. Marco Aurélio Bellizze, por maioria, julgado em 08/05/2018, DJe 05/06/2018
DIREITO CIVIL, DIREITO DO CONSUMIDOR
Ação de obrigação de fazer. Provedor de aplicação de pesquisa na internet. Proteção a dados pessoais. Desvinculação entre nome e resultado de pesquisa. Direito ao esquecimento. Possibilidade.
É possível determinar o rompimento do vínculo estabelecido por provedores de aplicação de busca na internet entre o nome de prejudicado, utilizado como critério exclusivo de busca, e a notícia apontada nos resultados.
No caso, pleiteia-se a desindexação do nome da recorrente, em resultados nas aplicações de busca na internet, de notícia sobre fraude em concurso público, no qual havia sido reprovada. Atualmente, o fato referido já conta com mais de uma década, e ainda hoje os resultados de busca apontam como mais relevantes as notícias a ela relacionadas, como se, ao longo desta década, não houvesse nenhum desdobramento da notícia nem fatos novos relacionados ao nome da autora. Quanto ao assunto, a jurisprudência desta Corte Superior tem entendimento reiterado no sentido de afastar a responsabilidade de buscadores da internet pelos resultados de busca apresentados, reconhecendo a impossibilidade de lhe atribuir a função de censor e impondo ao prejudicado o direcionamento de sua pretensão contra os provedores de conteúdo, responsáveis pela disponibilização do conteúdo indevido na internet. Há, todavia, circunstâncias excepcionalíssimas em que é necessária a intervenção pontual do Poder Judiciário para fazer cessar o vínculo criado, nos bancos de dados dos provedores de busca, entre dados pessoais e resultados da busca, que não guardam relevância para interesse público à informação, seja pelo conteúdo eminentemente privado, seja pelo decurso do tempo. Essa é a essência do direito ao esquecimento: não se trata de efetivamente apagar o passado, mas de permitir que a pessoa envolvida siga sua vida com razoável anonimato, não sendo o fato desabonador corriqueiramente rememorado e perenizado por sistemas automatizados de busca. Por outro vértice, aqueles que quiserem ter acesso a informações relativas a fraudes em concurso público, não terão seu direito de acesso impedido, porquanto as fontes que mencionam inclusive o nome da autora permanecerão acessíveis. Contudo, sua busca deverá conter critérios relativos a esse conteúdo, seja em conjunto com o nome da autora, seja de forma autônoma.