EMENTA
RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. VIOLAÇÃO DO ART. 579, CAPUT E
PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPP. CONTROVÉRSIA ACERCA DA APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA
FUNGIBILIDADE RECURSAL AOS CASOS EM QUE, EMBORA CABÍVEL A INTERPOSIÇÃO DE
RECURSO EM SENTIDO ESTRITO, A PARTE IMPUGNA DECISÃO MEDIANTE APELAÇÃO.
POSSIBILIDADE. QUESTÃO DECIDIDA NO JULGAMENTO DOS EDCL NO AGRG NOS EARESP N.
1.240.307/MT. ERRO GROSSEIRO. CIRCUNSTÂNCIA INAPTA A CARACTERIZAR, POR SI SÓ, A
MÁ-FÉ PRECONIZADA NA NORMA PROCESSUAL (ART. 579 DO CPP). INTELIGÊNCIA DO ART. 80
DO CPC, APLICADO NA FORMA DO ART. 3º DO CPP.
1. No julgamento dos EDcl no AgRg nos EAREsp n. 1.240.307/MT, a Terceira Seção
desta Corte, ao acolher o voto do Ministro Joel Ilan Paciornik, estabeleceu as
seguintes conclusões: 1) a ausência de má-fé, enquanto pressuposto para
aplicação do princípio da fungibilidade, não é sinônimo de erro grosseiro,
devendo ser adotado o critério estabelecido em lei sobre o que se considera
litigância de má-fé (art. 80 do CPC, c/c o art. 3º do CPP), de modo que é
possível rechaçar a incidência do princípio da fungibilidade com base no erro
grosseiro na escolha do recurso, desde que verificado o intuito manifestamente
protelatório; 2) a tempestividade, considerando o prazo do recurso cabível, bem
como o preenchimento dos demais pressupostos de admissibilidade do reclamo
adequado, também consubstanciam requisitos para aplicação da fungibilidade, pois
o parágrafo único do art. 579 do CPP traz requisito implícito para a aplicação
do princípio da fungibilidade, qual seja, a possibilidade de processamento do
recurso impróprio de acordo com o rito do recurso cabível, de modo que o
princípio da fungibilidade não alcança as hipóteses em que a parte lança mão de
recurso inapto para o fim que se almeja ou mesmo direcionado a órgão
incompetente para reformar a decisão atacada, tal como no caso de oposição de
embargos de declaração ou interposição de agravo interno em face da decisão que
inadmite o recurso especial na origem.
2. Em suma, em sede processual penal, caso verificado que o recurso interposto,
embora flagrantemente inadequado (erro grosseiro), foi interposto dentro do
prazo do recurso cabível e ostenta os requisitos de admissibilidade daquele
reclamo, sendo possível processá-lo de acordo com o rito do recurso cabível, é
possível receber tal reclamo no lugar daquele que seria o adequado por força do
princípio da fungibilidade recursal, desde que não se verifique intuito
manifestamente protelatório, condição apta a caracterizar a má-fé (art. 80 do
CPC, c/c o art. 3º do CPP) e a obstar a incidência da norma processual em
comento (art. 579 do CPP).
[...]
4. Recurso especial provido, fixada a seguinte tese: é adequada a aplicação do
princípio da fungibilidade recursal aos casos em que, embora cabível recurso em
sentido estrito, a parte impugna a decisão mediante apelação ou vice-versa,
desde que observados a tempestividade e os demais pressupostos de
admissibilidade do recurso cabível, na forma do art. 579, caput e parágrafo
único, do Código de Processo Penal.
(REsp 2082481 MG, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Terceira Seção,
julgado em 11/9/2024, DJe de 13/9/2024)