EMENTA
DIREITO ADMINISTRATIVO E AMBIENTAL. RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. TEMA 1.221.
RESPONSABILIDADE CIVIL. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO PÚBLICO. ESTAÇÃO DE
TRATAMENTO DE ESGOTO - ETE. MAU CHEIRO. AÇÃO INDENIZATÓRIA. DANOS MORAIS. JUROS
DE MORA. TERMO INICIAL. RESPONSABILIDADE CONTRATUAL. CITAÇÃO VÁLIDA. ARTS. 240
DO CPC E 405 DO CC.
1. Cuida-se de ação de procedimento ordinário proposta contra a Companhia de
Saneamento do Paraná - Sanepar, com o fim de obter indenização pelos danos
morais decorrentes da irregular emissão de gases por Estação de Tratamento de
Esgoto gerida pela ré, com produção de intenso mau cheiro.
2. O Tema Repetitivo 1.221, ao ensejo de sua afetação, foi assim delimitado:
"Definição do termo inicial dos juros moratórios no caso de demanda em que se
pleiteia reparação moral decorrente de mau cheiro oriundo da prestação de
serviço público de tratamento de esgoto".
3. Tradicionalmente, o Superior Tribunal de Justiça define os efeitos da mora,
dentre eles, especialmente, o termo inicial dos juros moratórios, a partir da
categorização doutrinária clássica da responsabilidade civil quanto à origem da
relação jurídica travada entre os litigantes, distinguindo a responsabilidade
contratual da extracontratual. Inteligência da Súmula 54/STJ.
4. A despeito de oferecer solução para fixar o termo inicial dos juros
moratórios, referido enunciado sumular não aponta os critérios distintivos das
espécies de responsabilidade contratual e extracontratual. Revisitando os
precedentes que deram origem ao aludido verbete, nota-se que o discrímen
utilizado se valia da classificação do ilícito: se absoluto, responsabilidade
extracontratual; ou, se relativo, contratual.
5. Entretanto, a evolução dos estudos em Direito Civil aponta para a superação
da teoria dualista, a partir do foco na reparação integral dos danos, aplicável
tanto para os casos de responsabilidade contratual como extracontratual.
6. Importante frisar que o próprio CDC não adotou essa classificação dual,
valendo-se de conceitos mais modernos da responsabilidade (em regra objetiva e
solidária) pelo fato ou por vício do produto ou do serviço (arts. 12 a 25 do
CDC), circunscrevendo a responsabilidade subjetiva apenas aos casos de
profissionais liberais, que será apurada mediante a verificação de culpa (art.
14, § 4º, CDC), conquanto no diploma consumerista não haja nenhuma disposição
específica referente à constituição em mora.
7. Nesse rumo, com a possibilidade de violação positiva do contrato e de seus
deveres anexos, inspirados sob os princípios da boa-fé objetiva e da probidade,
os quais devem permear todo o vínculo contratual, inclusive na fase de execução
(sobretudo nos contratos de prestação continuada), também estará caracterizada a
mora (inadimplemento parcial) nos casos de cumprimento imperfeito, inexato ou
defeituoso da prestação.
8. Desse modo: (i) na responsabilidade contratual, é possível a caracterização
da mora anteriormente à citação válida: (a) na obrigação positiva, líquida e com
termo certo; (b) em caso de anterior notificação do responsável pela reparação
dos danos; (c) quando verificado inadimplemento absoluto devidamente comprovado
nos contratos de prestação continuada; (ii) na responsabilidade extracontratual,
a regra é a constituição da mora a partir do evento danoso, mas também se mostra
possível a sua configuração a partir da citação válida, quando ela não restar
efetivamente comprovada em momento anterior; e (iii) na dúvida, deve ser
considerada a citação válida como termo inicial da mora.
9. TESE REPETITIVA: No caso de demanda em que se pleiteia reparação moral
decorrente de mau cheiro oriundo da prestação de serviço público de tratamento
de esgoto, os juros moratórios devem ser contados desde a data da citação
válida, salvo se a mora da prestadora do serviço tiver sido comprovada em
momento anterior.
[...]
(REsp 2090538 PR, relator Ministro Sérgio Kukina, Primeira Seção, julgado em
27/11/2024, DJe de 4/12/2024.)
(REsp 2094611 PR, relator Ministro Sérgio Kukina, Primeira Seção, julgado em
27/11/2024, DJe de 4/12/2024)