EMENTA
[...] TRIBUTÁRIO. QUEBRA DO SIGILO BANCÁRIO SEM AUTORIZAÇÃO JUDICIAL.
CONSTITUIÇÃO DE CRÉDITOS TRIBUTÁRIOS REFERENTES A FATOS IMPONÍVEIS
ANTERIORES À VIGÊNCIA DA LEI COMPLEMENTAR 105/2001. APLICAÇÃO IMEDIATA.
ARTIGO 144, § 1º, DO CTN. EXCEÇÃO AO PRINCÍPIO DA IRRETROATIVIDADE.
1. A quebra do sigilo bancário sem prévia autorização judicial, para
fins de constituição de crédito tributário não extinto, é autorizada
pela Lei 8.021/90 e pela Lei Complementar 105/2001, normas
procedimentais, cuja aplicação é imediata, à luz do disposto no artigo
144, § 1º, do CTN.
2. O § 1º, do artigo 38, da Lei 4.595/64 (revogado pela Lei Complementar
105/2001), autorizava a quebra de sigilo bancário, desde que em virtude
de determinação judicial, sendo certo que o acesso às informações e
esclarecimentos, prestados pelo Banco Central ou pelas instituições
financeiras, restringir-se-iam às partes legítimas na causa e para os
fins nela delineados.
3. A Lei 8.021/90 (que dispôs sobre a identificação dos contribuintes
para fins fiscais), em seu artigo 8º, estabeleceu que, iniciado o
procedimento fiscal para o lançamento tributário de ofício (nos casos em
que constatado sinal exterior de riqueza, vale dizer, gastos
incompatíveis com a renda disponível do contribuinte), a autoridade
fiscal poderia solicitar informações sobre operações realizadas pelo
contribuinte em instituições financeiras, inclusive extratos de contas
bancárias, não se aplicando, nesta hipótese, o disposto no artigo 38, da
Lei 4.595/64.
4. O § 3º, do artigo 11, da Lei 9.311/96, com a redação dada pela Lei
10.174, de 9 de janeiro de 2001, determinou que a Secretaria da Receita
Federal era obrigada a resguardar o sigilo das informações financeiras
relativas à CPMF, facultando sua utilização para instaurar procedimento
administrativo tendente a verificar a existência de crédito tributário
relativo a impostos e contribuições e para lançamento, no âmbito do
procedimento fiscal, do crédito tributário porventura existente.
5. A Lei Complementar 105, de 10 de janeiro de 2001, revogou o artigo
38, da Lei 4.595/64, e passou a regular o sigilo das operações de
instituições financeiras, preceituando que não constitui violação do
dever de sigilo a prestação de informações, à Secretaria da Receita
Federal, sobre as operações financeiras efetuadas pelos usuários dos
serviços (artigo 1º, § 3º, inciso VI, c/c o artigo 5º, caput, da aludida
lei complementar, e 1º, do Decreto 4.489/2002).
6. As informações prestadas pelas instituições financeiras (ou
equiparadas) restringem-se a informes relacionados com a identificação
dos titulares das operações e os montantes globais mensalmente
movimentados, vedada a inserção de qualquer elemento que permita
identificar a sua origem ou a natureza dos gastos a partir deles
efetuados (artigo 5º, § 2º, da Lei Complementar 105/2001).
[...]
8. O lançamento tributário, em regra, reporta-se à data da ocorrência do
fato ensejador da tributação, regendo-se pela lei então vigente, ainda
que posteriormente modificada ou revogada (artigo 144, caput, do CTN).
9. O artigo 144, § 1º, do Codex Tributário, dispõe que se aplica
imediatamente ao lançamento tributário a legislação que, após a
ocorrência do fato imponível, tenha instituído novos critérios de
apuração ou processos de fiscalização, ampliado os poderes de
investigação das autoridades administrativas, ou outorgado ao crédito
maiores garantias ou privilégios, exceto, neste último caso, para o
efeito de atribuir responsabilidade tributária a terceiros.
10. Conseqüentemente, as leis tributárias procedimentais ou formais,
conducentes à constituição do crédito tributário não alcançado pela
decadência, são aplicáveis a fatos pretéritos, razão pela qual a Lei
8.021/90 e a Lei Complementar 105/2001, por envergarem essa natureza,
legitimam a atuação fiscalizatória/investigativa da Administração
Tributária, ainda que os fatos imponíveis a serem apurados lhes sejam
anteriores [...]
11. A razoabilidade restaria violada com a adoção de tese inversa
conducente à conclusão de que Administração Tributária, ciente de
possível sonegação fiscal, encontrar-se-ia impedida de apurá-la.
12. A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 facultou à
Administração Tributária, nos termos da lei, a criação de
instrumentos/mecanismos que lhe possibilitassem identificar o
patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte,
respeitados os direitos individuais, especialmente com o escopo de
conferir efetividade aos princípios da pessoalidade e da capacidade
contributiva (artigo 145, § 1º).
13. Destarte, o sigilo bancário, como cediço, não tem caráter absoluto,
devendo ceder ao princípio da moralidade aplicável de forma absoluta às
relações de direito público e privado, devendo ser mitigado nas
hipóteses em que as transações bancárias são denotadoras de ilicitude,
porquanto não pode o cidadão, sob o alegado manto de garantias
fundamentais, cometer ilícitos. Isto porque, conquanto o sigilo bancário
seja garantido pela Constituição Federal como direito fundamental, não o
é para preservar a intimidade das pessoas no afã de encobrir ilícitos.
14. O suposto direito adquirido de obstar a fiscalização tributária não
subsiste frente ao dever vinculativo de a autoridade fiscal proceder ao
lançamento de crédito tributário não extinto.
15. In casu, a autoridade fiscal pretende utilizar-se de dados da CPMF
para apuração do imposto de renda relativo ao ano de 1998, tendo sido
instaurado procedimento administrativo, razão pela qual merece reforma o
acórdão regional.
[...]
20. [...] Acórdão submetido ao regime do artigo 543-C, do CPC, e da
Resolução STJ 08/2008.
(REsp 1134665 SP, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em
25/11/2009, DJe 18/12/2009)